domingo, 29 de março de 2009

um anel e outras jóias

"thereza tem um anel.
e o anel de thereza tem um brilhante deste tamanho.
um brilhante lindo, tão puro, que parece uma grande gota de orvalho cristalizada.
tão lindo, tão puro que parece chocante avaliá-lo, comprá-lo a dinheiro.
principalmente a cruzeiros.
por muito favor, pedir-se-ia avaliar o anel de thereza em dólares.
que digo? nem dólar. só libra. e libra ouro, bem novinha.
essa concessão é necessária porque não é possível avaliá-lo em orvalho.
ou em lágrimas brilhantes.

thereza não usa o anel por exibição.
para ela, ele vale por sua beleza e como delicada prova de amor.
talvez represente uma gota do mar que narcílio pinta e que quis lhe oferecer engastado em um anel.
pode gostar que o apreciem, até que o invejem, nunca que o avaliem.

mas thereza tem outras jóias.
e das outras ela gosta de falar.
sem ser cornélia graco, ela tem muito gosto em apresentar as outras jóias do seu tesouro.
e como gosta de falar nelas!
e como gosta de falar delas!

querem vê-la feliz, peçam-lhe notícas dos filhos, peçam-lhe que fale deles, que conte história da vitória de cada um deles, admirem com ela a bela coleção de taças por eles conquistadas,
peçam para ver a dezena de medalhas conquistadas por cada um.
só viena tem mais de cinquenta.

esta semana ela anda especialmente eufórica, transbordando felicidade.
os seus campeões voltaram do sul, como diz a cantiga, "coberto de glória" e reno trouxe consigo o troféu da vitória.
o título máximo da sua categoria no tênis brasileiro: voltou campeão brasileiro de tênis na categoria juvenil.
uma vitória conquistada, sabe deus com que sacrifício, pois reno mal se refizera de um acidente que lhe trouxera o pulso engesssado até as vésperas da viagem.

e thereza ainda está mais contente porque essa vitória do reno conseguiu o milagre de sacudir o costumeiro torpor nacional pelos milagres dos santos da casa.
finalmente estão dando a reno o que é de reno.

e thereza que não fala de si, que não gosta de falar sobre seu anel, anda muito feliz, numa roda viva, a reponder a pergunta dos repórteres, admiradores e simples curiosos, não só sobre reno,
mas sobre viena e lorena também.
e possivelmente achará um jeitinho de encaixar na conversa a caçula luanda,
para quem já reservou lugar na coleção de troféus que enfeitam o atelier de narcílio."

artigo escrito pela colunista Bernadette, em 27 de junho de 1965.
falando de vovô, vovó, seu anel e filhos (mamãe e tios).

quarta-feira, 25 de março de 2009

coleção

quando eu era pequena, 7 pra 8 anos,
eu pegava meu caderno de escola,
escolhia umas páginas em branco
e saia escrevendo todas as palavras
que ia ouvindo, todas mesmo,
tentando nunca repetí-las.

escrevia em lista, longa que só ela.
eu colecionava palavras.

fazia isso sentada na frente da televisão,
metida no meio das conversas do meu avô
com minha avó, nos papos de telefone das
minhas primas lá em casa.

sempre amei as palavras.
as velhas e as novas,
as mais repetidas e as que nunca usei.

terça-feira, 24 de março de 2009

carta aos puros

"Ó vós, homens da sigla; ó vós, homens da cifra
Falsos chimangos, calabares, sinecuros
Tende cuidado porque a Esfinge vos decifra...
E eis que é chegada a vez dos verdadeiros puros."

Vinícius de Moraes